Nova crise deverá minar reestruturações ainda em andamento

Nova crise deverá minar reestruturações ainda em andamento

Nova crise deverá minar reestruturações ainda em andamento

 

A consultoria Alvarez & Marsal avalia que o impacto econômico sem precedentes da crise do coronavírus tem potencial para gerar uma nova onda de recuperações judiciais e extrajudiciais em patamares semelhantes aos observados no Brasil entre 2015 e 2017, quando grandes grupos sofreram com as consequências da Lava-Jato.

 

Leonardo Coelho, sócio-diretor da Alvarez & Marsal, afirma que muitas empresas estavam num momento de saída de quatro ou cinco anos de crise, concluindo a reestruturação das dívidas e, com raras exceções, voltando a operar, mas ainda sem um fluxo de caixa muito forte. Essa situação desafiadora chega, portanto, num momento em que ainda precisavam tomar fôlego para decolar. Em vez disso, vão enfrentar um cenário de paralisação da economia, com a interrupção do fluxo de pessoas que terá impactos em toda a cadeia produtiva.

 

“Num quadro como esse, as empresas vão precisar tanto de dinheiro novo de curto prazo, quanto alongar os pagamentos”, afirma Coelho. “Muitas, mesmo tendo feito a lição de casa, deverão sofrer.” Para o executivo, as medidas já anunciadas pelo governo foram importantes, mas ainda não suficientes porque a crise atual pede um receituário diferente do tradicional, de mexer nos juros e no compulsório dos bancos. “A indústria já se organiza pedindo perdão do governo para pagamentos de impostos. E muitos varejistas procuram orientação jurídica para habeas corpus preventivos para não recolher impostos, inclusive sobre folha de pagamento”, afirma.

 

Coelho destaca que segmentos do varejo tendem a ser os mais drasticamente afetados, pela combinação de ausência do fluxo de pessoas, possível desabastecimento de alguns produtos, em particular os importados da China e desemprego. “Uma combinação drástica, nunca vista”, diz. Ontem, ainda, começaram os anúncios de fechamentos de shoppings.

Segundo ele já houve lojas com redução da ordem de 60% a 85% das vendas no últimos fim de semana - no vestuário, o percentual atingiu entre 80% e 90%.
 

“Mesmo se houver acordo para suspender pagamentos de dívida corporativa nos próximos 120 dias, não resolve o problema. Alguns segmentos já estão com um nível de venda tão baixo que não conseguirão manter níveis mínimos de atividade porque isso não é possível com somente 10% ou 15% das vendas originalmente planejadas”, diz. Além de crédito, a suspensão de impostos seria relevante para manter o pagamento de salários e conteria uma onda de demissão brutal, embora cortes na indústria e varejo sejam certos, segundo ele, pois “ninguém aguenta três ou quatro meses de atividade parada”.

 

Dentro do varejo, alguns negócios vão viver estresse por excesso de demanda: alimentos, supermercados, limpeza e logística de bens de primeira necessidade.

 

“Esses vão estar sobrecarregados nos próximos quatro meses e servirão de algum alento para ocupar parte da mão de obra que será dispensada. Mas são quatro setores, frente a toda a economia. Por isso digo que a situação é muito drástica para ser tratada com receituário tradicional”, afirmou.

 

Segundo o executivo, empresas com um índice de alavancagem superior a 3 vezes o Editda já merecem atenção e mais cuidado na gestão financeira, diante das dificuldades atuais. “O planejamento até um mês atrás era de uma geração de caixa para uma expectativa de alta do PIB, que não tende a se confirmar”.

 

Um outro setor que preocupa é o agronegócio, em particular o ramo sucroalcooleiro, fortemente afetado pelo câmbio. Grãos e proteínas também tendem a ser impacto, mas mais diretamente pela redução de consumo, eventualmente. Além de qualquer negócio relacionado a turismo, também paralisado pela crise.

 

Coelho destacou ainda que, diante da demora do governo na percepção da gravidade da situação que essa crise trará para as empresas, está havendo muita movimentação de entidades setoriais para alinhar iniciativas e buscar soluções coordenadas.

 

“Há boa vontade coletiva no setor produtivo, incluindo também os grandes bancos, cientes da gravidade da situação”, diz.

 

Sob um aspecto, a saída da crise pode ser diferente da anterior. Diante dos anúncios recentes, o mundo será de juros ainda mais baixos, incluindo aí o Brasil, um cenário que poderia baratear, do ponto de vista das empresas, o acesso ao crédito.

 

“Mas para que haja crédito, de fato, é preciso que a situação esteja minimamente sob controle. Hoje, não vivemos uma situação de mensuração de risco, mas sim de incerteza generalizada, que leva à paralisação dos entes econômicos”, diz Coelho.

 

Autor(a)

Por Ana Paula Ragazzi — De São Paulo

Fonte

Valor|Globo

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